Veronica Lake: Bela, Sofisticada e Misteriosa

Ela era loira, misteriosa e sofisticada muito antes que Alfred Hitchcock imortalizasse o tipo. O porte ereto, delgado e altivo de Veronica Lake quebrou o padrão de beleza da época, introduzindo um novo modelo: o dela. A ponto de um repórter da revista “Cruzeiro” (Ano 1944, Edição 07) comentar a respeito da atriz: "Se você conseguir descobrir um palmo de seu rosto, por trás da mecha de cabelos louros, verá que ela é linda"! 
Ah, o cabelo! O penteado apresentado no filme "Revoada das Águias" foi copiado em todo o mundo. Para ter uma ideia do furor provocado na época imagine que era usado por 80% das jovens americanas. Como retratado no filme "A Incrível Suzana" (The major and the Minor, 1942), na cena em que a personagem Susan Aplegate, vivida por Ginger Rogers, entra em um baile e encontra nada menos que 24 moças com o mesmo visual da atriz. E pensar que tudo começou por puro acaso! "Um dia, o ventilador fez cair uma mecha sobre o meu rosto. Acharam que era um 'estilo' e continuei com o 'estilo acidental' até hoje" (A Noite, 01/12/1942).
Mas abaixo do penteado da atriz Veronica Lake, havia uma mulher, Constance Frances Marie Ockelman, uma nova iorquina de origem abastada, bem diferente da maior parte das colegas hollywoodianas. Na infância, no Brooklyn, Constance brincava de enfermeira. Ainda aos quatro anos pediu à mãe que lhe preparasse um uniforme; e aos dez, salvou um coelhinho das garras de um gato e tratou-lhe os ferimentos.
Depois, já em Hollywood, quando soube que o padrasto feriu o crânio, cuidou dele tão bem que o médico não precisou mudar os curativos. Como toda criança era levada, chegando até a subir em postes telegráficos. Mais tarde canalizou a energia para os esportes, dedicando-se a bicicleta, patinação, esqui, natação e equitação. Sempre citando os dois últimos como seus favoritos. Também gostava de dançar, demonstrando tanto talento para a arte que por duas vezes foi convidada para ser instrutora de dança. Talvez estivesse no exercício de práticas esportivas o verdadeiro segredo do corpo invejável que exibia, apesar de estar sempre degustando alguma coisa. Devido à glutonaria da menina, a mãe achava que mais cedo ou mais tarde a filha engordaria ou seria alta e forte. Nunca aconteceu nem uma coisa nem outra. Entretanto, apesar do aspecto delicado, Veronica não foi uma garota frágil nem doentia. E mais tarde, quando adulta, nunca precisou se preocupar com dietas!
No jardim de infância chegou a encenar uma peça na escola, mas afora essa experiência não se interessava por teatro nem por cinema. Nada que desse a entender que ainda seria uma grande atriz. Não gostava de brincar de bonecas e as duas únicas que teve eram negras. Sabia tricotar, costurar tapetes e cozinhar. Gostava de presentear familiares e amigos, mesmo que fosse com o que não era dela. Segundo a estrela, um dia ouviu uma vizinha chorando porque não tinha um vestido para ir a um baile. Generosamente, Connie, como era conhecida na época, foi ao armário da mãe, selecionou um modelo de 200 dólares e o ofereceu à moça, que o aceitou toda contente. Uma tarde, logo após o sucesso de "Revoada das Águias", sumiu, só aparecendo à noite para o jantar que marcara com os amigos. Ela não comentou nada sobre a ausência, mas a razão do desaparecimento é que passara aquelas horas conversando com um fã, tuberculoso, que lhe escrevera pedindo uma foto que ela foi entregá-la pessoalmente. 
Quanto à formação, foi educada no colégio Villa Maria, em Montréal, um dos melhores das redondezas de Lake Placid, onde vivia. Era boa aluna de Ciências; mas detestava Aritmética. Também estudou francês, língua que aprendera com certa facilidade. A Paramount descobriu que a atriz era bilíngue durante as gravações de "Contrastes Humanos". O diretor Preston Sturges, que estudara na França, comentava a respeito dela com outros colegas quando Veronica surgiu agradecendo pelos elogios em francês.
Também foi na infância que esteve no Brasil. "E não só no Brasil (mais precisamente no Rio e em São Paulo) como também na capital da Argentina e do Chile", contou ao jornal "A Noite" (suplemento, ano 1942, edição 716, p. 34). "Mas quase não lembro de nada...Tinha nessa ocasião cinco ou seis anos de idade...Meu pai, que era um homem de negócios, estava de férias na época. Acho que crianças não deviam viajar nunca, porque pouco aproveitam e estragam a viagem dos adultos", opinou. Durante muitos anos a artista ouviu os pais falarem da então capital brasileira, com uma certa nostalgia. Eles também andaram na Europa, mas não sentiam pelo velho mundo o entusiasmo que tinham pela América do Sul.
Connie poderia considerar a infância feliz se não fosse por um detalhe: a morte trágica do pai, Harry E. Ockelman, na explosão de um tanque industrial, na Filadélfia, quando a filha tinha apenas nove anos. A mãe, Constance Charlotta, casou um ano mais tarde com H. Anthony Keane, um desenhista comercial. 
Como a própria Veronica lembrou anos depois em um artigo que foi reproduzido em vários países e, no Brasil, publicado pela revista “Cinearte” (ano 1941, edição 553): “Papai e mamãe são dessas pessoas para quem uma filha representa mais do que uma simples criança para criar. É uma amizade para ser tratada com verdadeiro carinho e grande compreensão. Eles nunca me mandaram calar a boca, quando eu fazia perguntas embaraçosas, como as crianças fazem. Respondiam-me simplesmente seriamente. Não me ensinaram as noções do bem e do mal com um doce de recompensa por eu ser boazinha. Ou palmadas como castigo por minha má conduta. Em nossa casa, presumia-se apenas que, se nos estimássemos e nos respeitássemos, seríamos todos bons. Ninguém ofenderia ou faria o outro sofrer, nada de mau seria feito”. Todos os valores cultivados pelos Keane foram muito úteis para Constance anos mais tarde quando se determinou a ser atriz. 
Era avessa a badalações - costume que cultivou mesmo depois da fama - e não gostava de dormir tarde. De acordo com a atriz, como era proibida de chegar depois de uma da manhã, acostumou - se a dormir cedo. Normalmente era uma jovem pontual. Mesmo porque a punição era severa: não podia sair por uma semana. Mas pelo menos uma vez infringiu a norma severamente. Quando conheceu aquele que seria o futuro marido, John Detlie, na gravação de “Mamãe eu quero!”. Naquela noite só chegou em casa às três horas da madrugada. A adolescente ficou sem sair de casa por duas semanas e o casal ficou sem se ver no período. 
Muito quieta e reservada, sempre gostou de ficar só. Tinha poucos amigos e a casa do diretor Preston Sturges era uma das poucas que frequentava. Gostava de ópera e música sinfônica e não perdia espetáculos de ballet. Estudou piano no colégio e gostava de ler. "Leaves of Grass", de Walt Whitman, era um dos seus livros prediletos. Como cor tinha uma certa predileção por vermelho da China, tanto para suas toilettes como para decorações. 
Durante muito tempo morou no mesmo pequeno bangalô onde vivia com os pais em Beverly Hills, antes de casar. Sabendo o quanto ela gostava da casa, não a deixaram partir: quando ela casou, mudaram-se. 

Como Constance Keane se tornou Veronica Lake? 

Como uma garota quieta e reservada de repente começou a se interessar pelo badalado mundo da sétima arte? Como, se até quando passou duas semanas em Hollywood com a família não se interessava em visitar nenhum estúdio? Tudo começou em 1939 quando Gwen Horn, uma amiga da família, e aspirante à atriz, visitou à casa dos Keane em Lake City, Flórida. Horne logo ficou fascinada pelos cabelos de Veronica, na época com 17 anos, que pareciam "nylon", de tão finos e lustrosos que eram, e perguntou à garota se ela gostaria de acompanhá-la ao estúdio da "RKO". Era a gravação do filme "Adolescência" (Sorority House, 1939) e Gwen tinha um teste agendado para aquela tarde. Mas foi Connie quem ficou com o papel. Quando viu a acompanhante da candidata o diretor John Farrow logo notou o brilho metálico do cabelo da garota e ficou impressionado!
-Quem é esta linda moça de cabelos prateados?- perguntou.
-A filha de uma amiga - respondeu Gwen.
-Ótimo - retorquiu.
E voltando para Constance disse: "A senhorita deve ser fotogênica! Muito fotogênica! Queira tomar parte no filme, por favor". A princípio ela se negou argumentando que não era atriz. Foi preciso que  Gwen apelasse, dizendo: "Constance, seja boazinha e faça a vontade do senhor Farrow fazendo parte do projeto, junto com as outras moças". Veronica consentiu e vestindo as duas peças de banho aceitou integrar o time de lindas moças deitadas na praia artificial de "Adolescência". 
Mais tarde, porém, a equipe não gostou do desempenho da principiante e quase todas as suas cenas foram cortadas. Entretanto, foi o suficiente para que a adolescente tomasse gosto pelo cinema. Matriculou-se na escola de arte dramática "Bliss Haydon", estudando com afinco por nove meses antes de partir para uma nova investida. 
O segundo longa da carreira da atriz foi “The Wrong Room”. O projeto foi outro fracasso mas a estrela conservava dele uma lembrança terna. Em uma cena, o ator Leon Errol a encontraria desmaiada no quarto e a carregaria nos braços em direção ao salão. Era um "close-up" dele, mesmo assim Errol sugeriu: “Eu não poderia me abaixar um pouco mais e assim permitir que ela também aparecesse”. O palpite foi acatado pela equipe. 
Depois de alguns papéis sem importância apareceu em “Toda mulher tem segredos”, nove meses antes de “Revoada das Águias”, o primeiro verdadeiro grande sucesso da atriz. Na época pensavam que ela seria apenas “mais uma pequena engraçadinha”. Sabendo disso, comentou no primeiro dia de filmagem de "Revoada": “Mais uma pequena engraçadinha que vai trabalhar...”, conquistando rapidamente a simpatia de todos os colegas de equipe. No início de 1940 estrelou “Mamãe eu Quero!”, pela primeira vez com o penteado que a imortalizaria. O diretor Busby Berkeley particularmente gostava dele. Ajudava-o a identificá-la entre as outras 39 participantes do filme. 
Veronica foi escolhida entre mais de cem garotas e não achava que ganharia o papel. “Fiquei numa plataforma baixa, enquanto diretores, assistentes, 15 homens ao todo, nos inspecionavam. Senti o sangue me subir ao rosto. Senti vergonha e uma vontade louca de fugir dali, fugir de Hollywood e nunca mais voltar. Mas quando estava pensando isso soube que fora uma das escolhidas. Suponho que isto seja o destino...” Foi a sua maior participação em um filme até então.   
Pouco tempo depois o empresário dela conseguiu uma entrevista com um certo produtor. Veronica partiu para o local com a mãe a tiracolo. Quando foi chamada ao escritório, a senhora Keane ficou na sala de espera. De acordo com a atriz, cinco minutos depois o produtor começou a fazer investidas. “Não investidas sutis, como propostas e galanteios. Ele se dirigiu a mim, exatamente como um bandido de um filme policial! Lembro apenas que ao chegar ao canto do escritório, para onde recuara, resolvi chamar: 'Mamãe! Mamãe!' Ela entrou, correndo, como um pequeno ciclone. Mas ao vê-la entrar e sentindo-me salva, recuperei a calma e a presença de espírito. ‘Mamãe, quero apresentar-lhe o Mr...’ Que vontade louca de rir tive eu, ao ver o amoroso Mr...mudar de procedimento e apertar a mão de mamãe’”... Naturalmente Lake não conseguiu o papel mas saiu se perguntando: “Uma carreira no cinema vale tudo isso, todas essas situações embaraçosas e humilhantes?” 
Depois da experiência tão desastrosa, a diva conseguiu um novo teste. Desta vez para a M.G.M. O diretor de cast, Fred Wilcox, e Lillian Burns, professora dramática do estúdio, gostaram muito da participação dela no filme “Mamãe eu quero” e insistiram em um teste. Escolheram uma cena da peça "Springtide" e ensaiavam com Veronica Lake em todos os horários livres. No final consideraram o resultado bom e se alegraram junto com ela. “Você terá um contrato, você será uma estrela!", gritaram entusiasmados. 
Os dirigentes da Metro gostaram da audição. Mas um executivo quando viu a fita resmungou: "Essa lourinha aí, há dezenas iguais em Hollywood. Fora!". Quando soube do veredicto, Veronica pensou em desistir. Mas seus novos amigos levaram o celuloide para o produtor da Paramount, Arthur Hornblow, que procurava uma beldade para interpretar a cantora de “Revoada das Águias”. 
Quando Hornblow a conheceu não teve dúvidas de que estava na frente da pessoa certa. Só havia uma coisa errada: o nome! O produtor então comentou: “Seus olhos têm a frieza de um lago azul”! Foi assim que Constance Keane passou a chamar-se Veronica Lake. Em que Veronica era da secretária dele. A garota soube que foi escolhida quando preparava o cabelo para um shampoo. “Não tive tempo de tirar o óleo, enrolei apenas um turbante na cabeça, passei um pouco de batom nos lábios e apresentei-me no estúdio, onde Murray Feil logo me apresentou ao senhor Hornblow. Assinando meu contrato, o óleo começou a escorrer do turbante pelo rosto. Todos nós rimos”.  Longe de detestar o efeito, a produção amou. Uma semana depois, Veronica encontrou-se com Harry Haydan, instrutor da sua escola dramática, que ignorando a transição de nome, lamentou: "É uma pena que tenha perdido o papel em 'Revoada das Águias'! Você conhece a garota que eles escolheram?". “Sim! E muito bem!”, respondeu a garota. 
Depois de contratá-la, a ambição da Paramount era transformá-la em uma "Glamour Girl". “É preciso preparar o público para a sua estreia na tela”, comentavam. No entanto, Veronica, que estava noiva de John Detlie há vários meses, casou um dia antes de começar a gravação de “Revoada das Águias”. A atitude desapontou os executivos do estúdio que gostariam de apresentá-la como um novo símbolo sexual. Como apresentar como mulher fatal alguém que era na realidade uma tranquila dona de casa? O episódio marcou o começo dos atritos da estrela com os patrões, nascendo aqui sua fama de rebelde. Por sorte, Veronica conseguiu persuadi-los: "Se eu estiver bem no filme, creio que o público se interessará por mim de qualquer jeito. Caso contrário, que importa? Darei o melhor de meu trabalho a qualquer papel, a qualquer filme designado pelo estúdio. Estudarei, serei obediente e pontual, escutarei as ordens do diretor. Mas reservarei também algum tempo para o meu lar”, argumentou.

Fama, Moda e Brigas

O filme “Revoada das Águias” foi um sucesso! O crítico Ernest Bettes recebeu Veronica Lake como "a mulher mais sedutora e fulminante que a sétima arte conheceu desde Jean Harlow". E continuou: "Não posso prever por essa interpretação se você ainda será uma estrela. Isto depende de que produtores não explorem suas faculdades de sedução até à exaustão. Depende também daquilo que você pensa e deseja". E aconselhou: "Evita que te preguem na testa a etiqueta de sereia". Para a revista “Fon Fon” (ano 1941 edição 37) Lake era a nova Theda Bara. “A evolução da vampira para a ‘glamour girl’”, assinalou. "Reparai quando a virdes como seu olhar é da Garbo, e o seu todo é de Theda Bara". 
O cineasta Preston Sturges também foi outro entusiasta da diva. Ele a conheceu quando a atriz almoçava, só, no café da Paramount. Na época o diretor filmava “As três noites de Eva” e achou que a moça seria a estrela perfeita para contracenar com Joel McCrea em “Contrastes Humanos”. A experiência foi tão boa que Sturges cercou a novata de elogios: "Acho-a diferente de todas as demais artistas", confessou. "O público nunca a confundirá com nenhuma outra. Muito menos com as novatas". E acrescentou: "Essa jovem tem individualidade, não importa como se penteie", revelou à revista "A Scena Muda" (Ano 1942, Edição 1086).
Mesmo aparecendo muito pouco na fita, Veronica ofuscou tanto o brilho do colega McCrea, que ele se propôs a não trabalhar com ela novamente: "A vida é muito curta para se fazer dois filmes com Veronica Lake", murmurou. No entanto, mudou de ideia depois porque os dois trabalharam juntos em "Fúria Abrasadora" (Ramrod, 1947). 
O sucesso de crítica ecoou entre o público e Lake se tornou do dia para a noite uma das estrelas mais adoradas de Hollywood, com direito a pedidos de fotografias, autógrafos, cartas de fãs, 47 insígnias de clubes de aviação e às mais inusitadas propostas. Também foi a atriz mais fotografada de 1942, de acordo com a revista "Fon Fon" (Ano 1942, Edição 50, p. 24).
Durante a gravação de "Contrastes Humanos", sabendo que o intervalo da filmagem de uma cena, gravada na rua, duraria mais de uma hora, saiu com a auxiliar de maquiagem Mary Ann Jones para fazer compras em uma loja. Na época a atriz já era relativamente célebre e se precaveu do assédio dos fãs disfarçando-se. No caso, passando os cabelos para as orelhas de trás. 
No entanto, o embuste não enganou os admiradores da estrela. Quando a reconheceram, avançaram na atriz na expectativa de levarem para casa alguma relíquia da diva. Ao ser bloqueada contra uma parede, a intérprete teve uma ideia! “Mas, eu não sou Veronica Lake", explicou. "Meu nome é Constance Keane”. Não acreditaram. “Pode provar?”, perguntou alguém da multidão. A atriz mostrou a carteira de identidade, e a aglomeração partiu dispersa, murmurando apenas a semelhança entre as duas. 
Um admirador, contudo, não acreditou e argumentou: “Desculpe, moça, mas o truque não colou. Eu sei muito bem que você é Veronica Lake, embora seu nome seja Constance Keane. Você pode ou não me dar um autógrafo?” Nesse momento o marido da artista, que era muito ciumento, virou-se e deu um soco na cara do abusado. Para amenizar o clima, Lake teve de conceder o cobiçado autógrafo para o fã, que de quebra ainda ganhou um beijo da diva. O admirador desmaiou em seguida, sem deixar claro se o desmaio foi efeito do soco ou emoção pelo beijo.
Na época o mundo atravessava sua Segunda Grande Guerra e a moda prescrevia um novo padrão de beleza: mais busto e quadris pequenos. Mais precisamente, 24 polegadas para busto e 33 para quadris. Com seus 49 quilos distribuídos em 1,51m, Veronica Lake era a atriz que melhor se enquadrava no modelo. 
Além do manequim, os cabelos lisos, soltos sobre os ombros, com uma mecha cobrindo o olho direito, apelidado de “tapa-olho”, tornou-se sua marca registrada. E o bem mais valioso da estrela! Apenas a cabeleireira da “Paramount”, Haldvig Mjorud, tinha permissão para retocar sua cabeleira. Rapidamente o penteado conquistou uma legião de fãs em todo o mundo! Para promover o filme "Contrastes Humanos" no Brasil, o escritório da Paramount do Rio de Janeiro associou-se à rádio Mayrink Veiga (PRA - 9) para eleger a melhor imitadora de Veronica Lake no país. A divulgação deu certo! Quando soube do sucesso brasileiro de "Contrastes Humanos", Veronica escreveu para o escritório carioca do estúdio agradecendo pela publicidade, segundo a revista "Fon Fon" (Ano 1942, Edição 48).
Não demorou para que o "penteado tapa-olho" começasse a provocar uma série de problemas para as tietes que substituíram nas fábricas os homens que se alistaram como soldados para a Segunda Guerra. O Conselho Nacional de Segurança observou que as mulheres que portavam o visual eram menos produtivas, porque tinham de afastar o cabelo dos olhos. Além disso, a mecha de cabelos caída sobre a vista dessas jovens, prejudicava-lhes a visão, causando acidentes quando seus fios de cabelo prendiam em polias ou máquinas dos postos de trabalho.
O Departamento de Guerra então interveio pedindo ao estúdio que a atriz mostrasse os dois olhos para evitar que as empregadas das fábricas de munições a imitasse, com prejuízo para o trabalho. Na época corria um rumor de que a própria Veronica Lake queimava o cabelo acidentalmente quando fumava.
Para provar sua preocupação com a defesa nacional não só mudou o corte como aceitou um papel menor no filme "Legião Branca", interpretando uma enfermeira da Cruz Vermelha, durante o combate de Pearl Harbor. Também colaborou com as forças armadas levantando fundos com a venda de bônus de guerra.
Mas não era apenas o penteado da atriz que era imitado no início dos anos 40. As fãs da estrela também copiavam seus vestidos. Para agradar às admiradoras, a Paramount divulgava fotos do figurino que a diva usaria no próximo filme, na expectativa de que Lake ditasse a moda da próxima estação. No entanto, das peças do vestuário, tinha uma certa predileção por sapatos. Chegando a ter pares chineses, holandeses, hindus, árabes. Quando um fã baiano soube, enviou-lhe um par de sandálias, do mesmo modelo usado pelas quituteiras de Salvador. Segundo a revista "Scena Muda" (ano 1942, edição 97, p. 6), a artista considerou os calçados tão confortáveis que adorou o presente! Um outro hobby da vedete era colecionar bonecas! A intérprete tinha uma coleção de bonecas de todas as partes do mundo, de várias épocas, fazendo parte da galeria um acervo que ilustrava episódios do reinado de Louis XV.
Depois de “Contrastes Humanos” Veronica Lake estrelou “Alma Torturada”, o primeiro de uma série de filmes que faria ao lado de Allan Ladd. O sucesso dos filmes faria do casal uma das duplas mais famosas de Hollywood e de Veronica Lake a primeira "bombshell" do Cinema “Noir”. 
Em 1942 Veronica Lake era a rainha de Hollywood e a "Paramount" queria explorá-la ao máximo! A onipresença da atriz no longa "Casei-me com uma Feiticeira" (I Married a Witch, 1942) não passou despercebida pelo colega Fredric March. O ator murmurava nos bastidores que o filme deveria ter o título trocado por "I married a 'bitch'" (Algo como "Casei com uma 'Vagabunda'"). O casal teve vários desentendimentos durante as filmagens e March jurou que não voltaria a atuar com ela. Em compensação, em "Legião Branca" (So Proudly we Hail, 1943), Lake contracenou com Paulette Goodard e Claudette Colbert em uma harmonia rara para uma atriz que não era muito apreciada pelos colegas. Era comum atores que trabalharam com ela, ou membros da equipe de produção, reclamarem do seu comportamento. Durante a gravação do longa "A Dália Azul", ganhou do escritor Raymond Chandler o apelido de "'Moronica' Lake", em que "moronica" era corruptela de "moronic". Idiota em inglês.
Curiosamente, quando Veronica Lake apareceu em "Revoada das Águias" com um cacho do cabelo cobrindo o olho direito, o penteado tornou-se seu diferencial. Sua marca registrada. A ponto de ofuscar o talento e a beleza da intérprete. Sem o penteado, Veronica tornou-se uma estrela cada vez mais comum. Conforme notou o crítico Leon Eliachar: "Uma vez que levantou aquela mecha de cabelo que lhe cobria metade do rosto, dissipou-se toda a fascinação e o mistério que a envolvia, porque de fato tinha ela outro olho", declarou à "Scena Muda (Ano 1948, Edição 41, p. 13). A opinião do especialista parecia ser também a do público, porque desde a mudança de visual sua carreira nunca mais foi a mesma. Ela ainda chegou a receber uma medalha de Atriz Revelação na Bélgica pelo filme "Legião Branca" mas sua trajetória estava em franca decadência.     
“A Dália Azul” foi o último filme de sucesso da carreira de Veronica Lake. A artista não resistiu à concorrência com outras atrizes que apareceram no período. Ela até continuou fazendo filmes, mas ninguém falava mais nela.  Rita Hayworth, Jude Garland, Lauren Bacall ou Gene Tierney tornaram-se mais emblemáticas para os anos 40. E os holofotes que vinham diminuindo apagaram de vez nos anos 50. 
Mesmo assim, em 1951, a atriz foi vítima de assédio de um fã. Certa vez, saindo de um hotel com o marido, André de Toth, um advogado, Harold Carbone, puxou a famosa cabeleira da artista. Além de levar uma surra do marido da estrela, o admirador foi condenado a pagar uma multa de cinquenta dólares e alguns dias na cadeia. Na prisão, recebeu uma caixinha com alguns cabelos loiros amarrados por uma fita de seda. Junto com a mecha estava o recibo da multa que a remetente desconhecida pagara. Carbone nunca teve dúvida da autoria da carta, que não poderia ser outra além do próprio ídolo (Revista Hollywood, ano 1951, edição 62). 

A Mulher além da Atriz 

Veronica Lake era uma mulher muito romântica e quando um dia lhe perguntaram quais eram os atributos que mais apreciava em um homem, descreveu: "Finura, sinceridade, habilidade e inteligência. Quando alguém encontra um homem com todas essas qualidades terá realmente conseguido alguma coisa. Tendo isso, acredito que muitas mulheres concordarão com a escolha. Não precisa explicar o porquê”. 

Pelo jeito John Detlie, André de Toth e Joseph McCarthy reuniam todas essas qualidades, porque um dia estiveram casados com ela. Pouco tempo depois do primeiro casamento escreveu: “Espero ter em ‘As Viagens de Sullivan’ o mesmo sucesso que, segundo dizem, eu tive em ‘Revoada das Águias’. Mas se não tiver, isso não me fará sofrer. Já tive sonhos sobre Hollywood. Não os tenho mais. Nunca mais me preocuparei com o que Hollywood pode ou não pode me dar. Guardarei todo interesse e toda a atenção para meu marido e meu lar”. Mas não foi bem isso que aconteceu. Pouco antes da gravação de “Contrastes Humanos” descobriu que estava grávida. E para os seus biógrafos ela não queria a criança. Depois do nascimento da filha, Elaine Detlie, teve que se dividir entre os papéis de esposa, mãe e símbolo sexual. Não conseguindo conciliar vida pessoal e profissional, divorciou-se de Detlie em 1943.
De acordo com os biógrafos da atriz, Veronica Lake nunca foi uma mulher muito maternal. A afirmação contraria a impressão passada ao repórter do jornal "A Noite" quando mostrou com um certo orgulho o retrato da primogênita, na época com 14 meses, chamando-a de "my bambina".
Um ano após o divórcio casou com o cineasta húngaro André de Toth, com quem teve dois filhos, André Michael e Diana. Na época seu cachê era um dos mais altos de Hollywood. Ganhava não só como atriz mas também como modelo. Veronica, que já tinha uma fazenda, comprou também um avião, que ela mesma pilotava. Na época, mesmo tendo uma vida confortável, a atriz não abria mão de fazer os serviços domésticos. Principalmente cozinhar e seu prato preferido era salada mista. A criada se limitava praticamente a cuidar das crianças. O trabalho se dissolveu ainda mais depois que a mãe de Toth trocou a Hungria pelos Estados Unidos, indo morar com o filho e a nora.  A sogra não só ajudava nos serviços domésticos como cuidava das crianças que em pouco tempo aprenderam a língua da avó.
Diferentemente de outras estrelas hollywoodianas, como Joan Crawford, Veronica Lake nunca ganhou publicidade em cima dos filhos. A diva nunca deixava as crianças serem fotografadas. Por isso certos fãs chegaram ao cúmulo de escreverem perguntando se elas tinham alguma espécie de deficiência. A intérprete respondia apenas: “Só quero que cresçam normalmente”. Além disso, em março de 1943, quando Elaine tinha 19 meses,  o diretor Preston Sturges perguntou à Veronica se ela aceitaria que a filha fizesse uma aparição no filme "The Great Moment". Lake recusou alegando que a garota era ainda muito pequena e não podia opinar se gostaria ou não de participar do projeto. Quando ela tivesse idade suficiente, deliberaria livremente, por si mesma, a carreira que gostaria de seguir, afirmou (Revista Careta, Ano 1943, Edição 1815). Também  certa vez, ao pegá-la na escola, ouviu a garota comentando: "Minha mãe é Veronica Lake, a estrela de cinema"! Nesse momento pensou em dar uma bofetada na menina. Mas desistiu quando viu que eram as próprias colegas que passavam para a amiguinha o delírio de grandeza.
Apesar de posar na época como uma dona de casa modelo, a atriz teve uma vida pessoal bastante movimentada. Gary Cooper, Clark Gable, Howard Hughes, Victor Mature, Jean Negulesco, Bob Hope e John F. Kennedy foram alguns dos seus amantes mais célebres. Mas de todos considerava como sendo o melhor o milionário Aristóteles Onassis. Também revelava para quem quisesse saber que usava o sexo para conseguir vantagens em seus contratos. "Se meu produtor pegar o avião às sete horas, às oito eu o terei levado para a cama e às nove terei obtido tudo que quiser", contava. No entanto, rejeitou as investidas de Errol Flynn e recusou o cheque de 100.000 dólares que o magnata americano Tommy Manville ofereceu para que casasse com ele.
Politicamente falando, se Veronica Lake fosse viva hoje, talvez se identificasse com o movimento feminista. Ou pelo menos simpatizasse com ele. No início dos anos 40 escreveu o artigo "Das Desvantagens da Franqueza" defendendo a importância da união das mulheres para o sucesso delas mesmas. "O sucesso, quer em sua carreira, quer na vida pessoal, não depende da estima dos homens, mas sim da boa vontade das mulheres".
E criticando o reduzido número de mulheres em cargos de destaque na sociedade, disparou: "Há poucas mulheres ocupando cargos executivos em nosso país. Noventa por cento dos editores, presidentes, vice - presidentes e gerentes das grandes companhias são homens também. Só há diretora em Hollywood. E nem uma única produtora. Uma estrela famosa comentava comigo outro dia: 'Um ator pode esperar ser diretor ou produtor depois que começa a decair. As atrizes, porém, o mais que podem esperar é fazer papéis característicos. Embora conheça melhor que qualquer homem tudo que se relaciona ao jogo de luzes, 'make-up' e direção'. Estou certa que os diretores do estúdio desmaiariam se eu algum dia sugerisse a ideia de dirigir um filme". Naquela época, Veronica Lake era a única estrela que era admirada por homens e mulheres.

 O Crepúsculo de um Ídolo 

Em 1952 a imprensa anunciou que a estrela e o marido abriram falência. Na época a Califórnia reclamou 63 000 dólares de impostos sobre a renda da atriz e o rancho da família teve de ser penhorado para pagar as dívidas do casal que na época beiravam os duzentos mil dólares. 
Veronica Lake e o marido se divorciaram no mesmo ano. E ela abandonou Hollywood, só voltando para a mídia mais de uma década depois quando jornalistas descobriram que estava trabalhando como camareira no hotel Martha Washington, de Manhattan. A princípio ela negou afirmando que na verdade estava lá como cliente. Mas depois confirmou a informação. Aos 46 anos começou a trabalhar na autobiografia. Escrita por Donald Bain, a publicação fez tanto sucesso que Veronica Lake passou seus últimos anos confortavelmente. Chegou a fazer mais dois filmes “Footsteps in the Snow” (1966) e “Flesh Feast” (1970) e se reconciliou com Hollywood. 
Em 1973 Veronica procurou o médico com queixa de dores no abdômen. Tinha cirrose. Hospitalizaram-na em um hospital de Vermont, onde morreu com diagnóstico de falência renal devido à insuficiência hepática e hepatite. Estava muito distanciada da família e morreu completamente só. Foi cremada e seus restos espalhados pelo mar. Mas Veronica Lake continua onipresente. Está no cacho do cabelo cobrindo uma parte do rosto de Jessica Rabbit, no penteado de Kim Basinger no filme "Los Angeles - Cidade Proibida" ou no visual de várias atrizes, inclusive de Kate Winslet quando subiu ao palco para receber o "Oscar" pelo filme "O Leitor". Sua carreira foi breve; mas a influência é atemporal.

Você Sabia?

Veronica Lake sonhava em viver Cleópatra nas telas. “No dia em que for convidada para o papel de Cleópatra, mas uma Cleópatra de verdade, darei por vividos todos os Natais de minha vida e passarei a ser fã novamente do velho papai Noel”, confessou à revista “Cruzeiro” (Edição 09 de 1945).

Tinha uma certa fixação pelo número treze. A razão é simples, o padrasto, H. Anthony Keane (13 letras), enamorou-se da mãe, Constance Charlotta, num dia 13 e casaram 13 meses depois. Veronica conseguiu o primeiro trabalho no cinema, no filme "Adolescência",  num dia 13. Por um dia escapou de nascer nessa data. O aniversário dela é comemorado no dia 14 de novembro.

Serviu de modelo para a estátua "Asa", um tributo aos cadetes de Randolph Field, trabalhado por Yucca Salamunich.

O filme “Casei com uma Feiticeira” inspirou a série “A Feiticeira”, vivida por Elisabeth Montgomery, nos anos 60.

Inscreveu-se no concurso de beleza em Miami em 1938 e ficou com o segundo lugar no Miss Flórida!

Mesmo adulta Veronica Lake se gabava de ser “expert” em subir em coqueiros!

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